Por Helena Lucas (@Ameninavelha)
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Logo no começo de relacionamento, recebo de presente do meu querido e do querido de vocês Humberto Finatti o álbum “O Segundo Depois do Silêncio” da banda Los Porongas. De costume, coloco no player para ouvir e tento criar alguma conexão musical e existencial com o álbum que está dedicando para ser minha trilha sonora daquele dado momento. Houve inúmeras razões para que eu cobiçasse o som e não desconcentrar a minha atenção ao presente.
Questões existenciais começam a rondar sua cabeça “…na boca da noite” (Bem Longe), quando a cidade de São Paulo vai mostrando a sua magnitude da sua hora do rush, quando as almas quase penadas, taciturnas e noturnas surgem para compor o cenário de semi-decadência na calada noite preta.
Qualquer migrante, poucos ou muitos anos, pode ver-se recolhido num ambiente imaginando que não poderia se materializar ali, talvez, há um ou dois anos – está ali porque se acredita em alguma coisa que só aquela atmosfera de cidade pode proporcionar. Seus melhores amigos são o tempo e o silêncio, a dúvida e a certeza, os paradoxos mais antigos do ser humano.
A banda Los Porongas lançou no ano de 2011 o álbum intitulado “O Segundo Depois do Silêncio”, o segundo trabalho em estúdio feito por Diogo Soares (letras e voz), João Eduardo (guitarra), Márcio Magrão (baixo) e Jorge Anzol (bateria) contém participações ilustres como Helio Flanders (Vanguart), Carlos Eduardo Gadelha (O Jardim das Horas), Leandro Febras e Thiago Perozzi (Nosotros), Maurício Pereira (ex-Mulheres Negras) e o coro Mais Massa.
Capa do álbum "O Segundo Depois do Silêncio", 2º trabalho em estúdio da banda Los Porongas (AC) |
Notavelmente, o amadurecimento dos quatro rapazes de Rio Branco (AC) chamou bastante atenção da crítica musical não só pela construção das letras, mas pela construção sinuosamente bem elaborada de sua melodia e instrumentalização. O recheio do álbum é bem psicodélico, algumas músicas marcadas pela presença da viola caipira, em minha opinião, um dos instrumentos que aproxima o nativo das características de sua terra natal mesmo que esteja longe dela para alcançar um objetivo na sua vida (o que também pode dar certo ar de nostalgia).
Pode afirmar-se que como letrista Diogo Soares ousa na medida certa ao retratar a consensual união entre o tempo e silêncio. Seu lírico nos remete em como o ciclo do tempo funciona para um recém-chegado a uma cidade tão corrida (o manifesto é visto em “e quando a gente vai deixar cada segundo respirar”, trecho da música “Cada Segundo”), tão esperançosa, tão cinza; é percebido, então, que a conquista do objetivo ou busca por respostas parece-nos mais uma trapalhada (destaque para a faixa “Bem Longe” e “Desordem [Time Out]) do que uma grandiosa ambição. A aliada solidão muitas vezes compõe um espaço melancolicamente poético, o que é mostrado na letra de “Fortaleza” (“Numa leve e linda solidão/não vou deixar de lado o que é dos meus). Não só crises existenciais são moldadas pelo tempo: há também uma faixa reservada para o romantismo com o título “A Dois”, uma baladinha bem leve, uma letra quase simplista que não pode ser considerada uma mera declaração de amor para “leigos”.
As surpresas que uma grande metrópole pode causar, mesmo que elas sejam esperadas, algum tipo de desconforto e confusão mental: você pode ser desconhecido, o herói, o escorraçado nacional, um mero sem teto, sem ânsia, sem identidade. Uma cidade como São Paulo pode proporcionar estranheza e deslumbramento mesmo para o nativo, mas as linhas esclarecedoras e análises suntuosas vem melhor do pensamento de um louco achando o encantamento em cada dor descoberta em momentos silêncios e contidos no segundo.
(texto publicado também no site Zap'n'Roll)
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